SÃO PAULO – A partir do próximo sábado (21), o Teatro Paulo Autran, no SESC Pinheiro, recebe a remontagem comemorativa dos 50 anos da encenação do Teatro Oficina de O Rei da Vela, de Oswald de Andrade, trazendo o diretor original da montagem, José Celso Martinez Corrêa, na condução do protagonista original Renato Borghi, que também festejam oitenta anos de idade. O cenário original de Hélio Eichbauer, com direito aos mesmos palco giratório e painéis artísticos, ganham o palco da nova montagem que há 50 anos revirou a estética teatral brasileiro.
Um ano antes do período mais difícil da ditadura militar, 1967, com a instauração do AI-5 e o início de uma verdadeira caça-às-bruxas pela Censura Militar, o Teatro Oficina, após debruçar-se sobre vasta pesquisa que ia da história à política brasileira, da filosofia à sociologia, da estética teatral aos gêneros do teatro brasileiro e deglutir todas essas informações recorreu a’ O Rei da Vela, do autor do Manifesto Antropofágico, para apresentar sua leitura, e primeira encenação do texto que completava 30 anos, assimilada do que haviam deglutido.
O Rei da Vela, iniciava, assim, um novo estilo de fazer teatro, um teatro genuinamente brasileiro, sem as amarras de nossas tentativas de, até então, copiar um modelo europeu.
Essa empreitada não foi de simples acolhida: ela sacudia com o gosto do público de teatro, geralmente formado por uma elite social e intelectual que não compreendia e nem aceitava aquele modo de colocar em contraposição o teatro popular (teatro de revista, circo-teatro etc.) e o teatro erudito (como uma ópera por exemplo) e menos ainda por tratar de um tema que colocava em cena a classe burguesa nova-rica versus uma aristocracia rural decadente, onde um banqueiro e dono de uma fábrica de velas casa-se com a filha de uma quatrocentona e decadente família aristocrática de São Paulo; a crítica, também, ficou desarmada – já que o que era apresentado, tanto em termos estéticos da encenação quanto da interpretação dos atores e da influência, explicitada no palco giratório, de companhias como o Berliner Ensemble de Bertolt Brecht – e sentiu-se um pouco retraída em emitir suas opiniões, os mais ortodoxos obviamente que não gostavam de nada do que era apresentado, entretanto críticos como Décio de Almeida Prado que se pautavam por uma crítica embasada na literatura dramática considera que “o ideal da encenação de J. C. M. Corrêa é ir sempre um pouco além do texto, ser mais Oswald de Andrade do que o próprio… o resultado é surpreendente em algumas cenas…”, o que caracteriza um modo de apreensão do espetáculo que está assustada com a novidade que se lhe apresenta. Segundo dados apontados por Fernando Peixoto da reação do público brasileiro, atores acabaram sendo agredidos verbalmente pela “espinafração”, conforme termo de Décio de Almeida Prado, “sexual, religiosa e artística”.
O rebuliço causado pela encenação também seguiu o espetáculo em sua temporada pela Europa, sobretudo na Itália. Na França, o espetáculo teve opiniões diversas da crítica, tendo o crítico mais importante do país, Bernard Dort, escrito a mais perfeita observação do espetáculo, sobre o título Uma Comédia em Transe, em que avaliava o espetáculo “um apelo raivoso e desesperado por um outro teatro: um teatro de insurreição”.
Certamente o peso histórico do espetáculo para a dramaturgia brasileira e, também, para o passo adiante do Teatro Oficina tornam a remontagem esperada e com um toque de curiosidade peculiar: estamos, espantosamente, sob o mesmo clima reacionário em relação ao sexo, à política e à religião, a diversidade está amplamente abalada por uma bancada evangélica em nosso Congresso Nacional que cultua a agressão, seja verbal e física, em nome dos “bons modos”.
Esperamos que o espetáculo, ainda, gere uma certa “indignação” de setores mais conservadores, como foi o ocorrido com o espetáculo que trazia uma transexual no papel de Jesus Cristo. Por um outro lado, também é de se esperar um salutar rebuliço na autoavaliação estética: segundo Fernando Peixoto, um dos eixos de discussão do espetáculo original era criticar uma certa cafonice do gosto pequeno burguês pela atuação e encenação à Europa. Hoje, também temos os pares dessa crítica, ou seja, nosso gosto excessivo pelos musicais norte-americanos e, também, uma reprodução no teatro do “realismo televisivo e cinematográfico”.
SINOPSE
No escritório de usura de Abelardo & Abelardo, o protagonista Abelardo I, banqueiro, agiota, o Rei da Vela, com seu domador de feras, o empregado socialista Abelardo II subjugam clientes numa jaula – devedores, impontuais, protestados. Burguês, Abelardo faz um negócio para a compra de um brasão: casar com Heloísa de Lesbos, que se negocia como valiosa mercadoria para manutenção da família, falida pela crise do café, no seleto grupo dos 5% da elite. Abelardo I, submisso ao capital estrangeiro do Americano, no terceiro ato leva um golpe de Abelardo II, que o sucede na manutenção da usura do capital.
O REI DA VELA
Direção: Zé Celso
Conselheira poeta: Catherine Hirsh
Assistente do diretor: Cyro Morais
Elenco: Renato Borghi, Zé Celso, Marcelo Drummond, Camila Mota, Danielle Rosa, Elcio Seixas, Joana Medeiros, Regina França, Ricardo Bittencourt, Roderick Himeros, Sylvia Prado, Tony Reis, Tulio Starling e Vera Barreto Leite
Ponto: Nash Haila e Joana Medeiros
Diretor de arte: Hélio Eichbauer
Assistente do diretor de arte: Luiz Henrique Sá
Arquitetura cênica: Carila Matzenbacher e Marília Gallmeister
Diretor de cena: Otto Barros
Contrarregra: Vinicius Alves
Figurinista: Gabriela Campos
Assistente de figurino: Marcela Lupiano
Camareira: Cida Melo
Iluminador: Beto Bruel
Operador de luz: Ricardo Morañez
Sonoplasta: Andréia Regeni
Operadora de som e microfone: Rodolfo Yadoya
Diretor de vídeo e câmera: Igor Marotti
Câmera: Cafira Zoé
Estrategistas de produção: Camila Mota, Marcelo Drummond e Zé Celso
Diretora de produção: Ana Rubia Melo
Produtor executivo e administrador: Anderson Puchetti
Assistente de produção: Ederson Barroso
Comunicação e editoração do programa: Brenda Amaral, Cafira Zoé e Camila Mota
Programação visual, Design Gráfico e Ilustrações: Igor Marotti
Programação web: Brenda Amaral
Makumbas gráphicas | imagiário: Cafira Zoé e Camila Mota
Arquivista: Thais Sandri
SERVIÇO
O REI DA VELA
De 21 de outubro a 19 de novembro de 2017. Sábados, às 19h e domingos, às 18h
Local: Teatro Paulo Autran (1.010 lugares)
Ingressos: R$ 50 (inteira), R$ 25 (meia: estudante, servidor de escola pública, + 60 anos, aposentados e pessoas com deficiência) e R$ 15 (credencial plena do Sesc: trabalhador do comércio de bens, serviços e turismo matriculado no Sesc e dependentes).
Duração: 3h30
Recomendação etária: 16 anos
PROGRAMAÇÃO PARALELA
O REI DA VELA – ONTEM E HOJE
José Celso Martinez Correa e Renato Borghi falam sobre os 50 anos da montagem de O Rei da Vela. A mediação é de Luiz Fernando Ramos.
Dia 26/10, quinta, às 20h
Livre. Grátis. Retirada de ingressos a partir das 14h.
LER E RELER “O REI DA VELA”
Oficina que tem por objetivo ler e reler a peça “O Rei da Vela”, do escritor, poeta e dramaturgo Oswald de Andrade (escrita em 1933).
O trabalho será realizado em três etapas:
- Aula aberta sobre o texto de Oswald de Andrade e seu contexto histórico, no momento de sua criação. Com Luis Fernando Ramos.
Dia 7/11, das 19h às 22h
- Análise e Deglutição em Ato
Análise do texto O Rei da Vela para iniciar a oficina prática em que serão vivenciados experimentos cênicos, propondo aos participantes uma deglutição do texto original a partir da releitura da peça. Com Cibele Forjaz, professora, doutora do curso de Artes Cênicas da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Os interessados deverão impreterivelmente participar da Aula Aberta com o professor Luis Fernando Ramos, que será realizada em 7/11.
Dirigida a atores, estudantes de teatro, dança e interessados nas artes do corpo. A partir de 16 anos. Vagas limitadas.
Inscrições a partir de 1º /11, na Central de Atendimento.
Dias 8, 14 e 15/11, das 19h às 22h.
- Contracultura à Moda Brasileira
Tomando como base o contexto artístico e social da primeira montagem de O Rei da Vela, os críticos Carlos Calado, Manoel da Costa Pinto e Welington Andrade conversam sobre os movimentos culturais que surgiram a partir desse momento histórico e de como se deu a evolução dos mesmos nesses 50 anos que se passaram.
Dia 17/11, sexta, às 20h30.
Local das atividades: Teatro Paulo Autran
Grátis. Retirada de ingressos a partir das 13h, no dia do evento.
SESC PINHEIROS
Endereço: Rua Paes Leme, 195.
Bilheteria: Terça a sábado das 10h às 21h. Domingos e feriados das 10h às 18h.
Tel.: 11 3095.9400.
Estacionamento com manobrista: Terça a sexta, das 7h às 21h30; Sábado, das 10h às 21h30; domingo e feriado, das 10h às 18h30. Taxas / veículos e motos: Credenciados plenos no Sesc: R$ 12 nas três primeiras horas e R$ 2 a cada hora adicional. Não credenciados no Sesc: R$ 18,00 nas três primeiras horas e R$ 3 a cada hora adicional. Para atividades no Teatro Paulo Autran, preço único: R$ 12 (credenciados plenos) e R$ 18 (não credenciados).
Transporte Público: Metrô Faria Lima – 500m / Estação Pinheiros – 800m