Maurício Mellone, para o www.favodomellone.com.br – parceiro do Aplauso Brasil
Com direção de Otávio Martins, a peça traz o embate entre um ator mais velho, um galã de TV e uma atriz que se envolveu com ambos. No elenco, Denise Del Vecchio, Eduardo Semerjian e Alexandre Slaviero
SÃO PAULO – A dramaturga Nanna de Castro com a peça A Bala na Agulha, que acaba de estrear no Teatro Tucarena, utiliza dos recursos de uma montagem teatral para discutir questões profundas do ser humano, como saber envelhecer dignamente, o valor do trabalho, a ambição, traição, perdas, frustrações, enfim, fala da vida e da morte.
Num jogo metalinguístico (uma peça dentro de outra peça), a trama começa com o veterano ator Chico Valente, vivido por Eduardo Semerjian, dividindo a cena com Cadu, interpretado por Alexandre Slaviero, no clássico de Samuel Beckett, Esperando Godot.
Logo nas primeiras falas, Chico interrompe tudo, tira uma arma e aponta para o jovem ator, que se assusta e não entende nada do que está acontecendo. Com a cumplicidade do sonoplasta, Chico conta que prendeu todos da equipe no camarim e que um duelo irá começar, com só o mais forte podendo sobreviver. Com o revólver sempre apontado ao rival, o velho ator humilha o rapaz e dispara suas frustrações, inseguranças e mágoas com a profissão e seu inglório destino.

Nesta hora, a grande atriz Célia de Castro, vivida por Denise Del Vecchio, sai da plateia e tenta impedir a disputa travada no palco entre seu velho companheiro de cena (e de vida) e o atual amante e parceiro na TV.
A referência ao dramaturgo irlandês Samuel Beckett não é a única na peça: durante o embate entre os três atores, vários textos dramáticos são citados.
“Esta é uma peça que usa de outras peças para falar da vida. Em poucos minutos o espectador entende que está dentro de um teatro assistindo a uma peça de teatro dentro de outra peça. Todas as referências estão explicadas no próprio texto e o espectador sabe o tempo todo o que está assistindo; assim pode se divertir e se emocionar com esta peça engenhosa de Nanna de Castro”, afirma o diretor Otávio Martins.
Além de tratar de temas provocadores, como por exemplo as oportunidades que a vida oferece —— enquanto uns aproveitam outros as deixam passar, A Bala na Agulha também dá a chance para que cada personagem possa explicitar sua visão de mundo.
Depois que Chico expõe suas fraquezas ao novato e à antiga companheira, Cadu pega o revólver, assume as rédeas da situação e mostra que tem potencial na profissão.
O poder moderador é exercido por Célia, que revela ter sido a articuladora daquela situação (fez questão de juntar o velho amigo que estava em dificuldade financeira com o jovem ator, para que pudesse se aperfeiçoar na carreira).
Com direção precisa do incansável Otávio Martins (em cartaz em mais duas produções, como ator em Três Dias de Chuva e na direção de Divórcio, agora no Teatro Fernando Torres), A Bala na Agulha se destaca pela bela cenografia de Cláudio Solferini, pela iluminação de Pedro Garrafa, mas principalmente pela sintonia em cena dos três atores.
Com um texto dedicado à arte de interpretação, Denise, Eduardo e Alexandre fazem jus à proposta da dramaturgia e esbanjam talento.
A peça permanece em cartaz até início de dezembro, não perca!
“A vida é grande demais para caber num palco e é justamente por isso que a gente faz teatro”
Roteiro:
A Bala na Agulha. Texto: Nanna de Castro. Direção: Otávio Martins. Elenco: Alexandre Slaviero, Denise Del Vecchio e Eduardo Semerjian. Assistentes de direção: Pedro Garrafa e Beto de Faria. Trilha sonora: Otávio Martins. Figurinos: Marichilene Artiseviskis. Cenografia: Cláudio Solferini. Iluminação: Pedro Garrafa. Fotografia: Dene Santos. Produção executiva: Marcela Bannitz. Direção de produção: Will Sampario.
Serviço:
Teatro Tucarena (300 lugares), Rua Monte Alegre, 1024, Perdizes, tel. (11) 3670-8455. Horários: sextas às 21h30, sábados às 21h e domingo às 19h. Ingressos: sexta R$ 40, sábado e domingo R$ 50. Duração: 70 minutos. Classificação: 14 anos. Temporada: até 1º de dezembro.