
SÃO PAULO – Comprovando que a escolha do Júri Técnico do Prêmio Aplauso Brasil de Teatro teve um sentido assertivo, o Projeto Teatro Mínimo do SESC Ipiranga apresenta até domingo (1º) mais um espetáculo de extrema qualidade, em muitos aspectos, que ajuda-nos a refletir sobre nossas possibilidades, emociona ao retratar um história absolutamente real e nos alerta sobre as soluções encontradas pelos políticos que pouco tem a ver com uma inequívoca preocupação com a saúde: Trata-se do belíssimo solo A Valsa de Lili, texto delicado e poético de Aimar Labaki.
Débora Duboc dá vida à Eliana Zagui – cuja autobiografia Pulmão de Aço serve de base à criação de Labaki – que há mais de quarenta anos está na UTI do Instituto de Ortopedia do Hospital das Clínicas de São Paulo, desde os dois anos de idade, por conta de uma poliomielite. A atriz, cuja voz peculiar e afinada são trunfos da sua excelência técnica, desenha, com impecável dicção, a agradável tessitura textual (Aimar Labaki, sem cair na autocomiseração), apresentando nuances emocionais em cada uma das palavras ditas.
Quem conduz a viagem dessa “valsa” é Débora Dubois que, em sincronia com Márcio Vinicius (arquitetura cênica e figurino) e Aline Santini (iluminação), faz da simplicidade um delicioso espetáculo para ver, ouvir e emocionar-se. Dubois guia Duboc com sutileza e o rigor físico exigido (preparada fisicamente por Doria Gark, já que a personagem mexe apenas a cabeça e é traqueostomizada). Como se houvesse uma partitura vocal, em que cada nota merece atenção especial, ao final, a melodia arrebata o espectador.
Agora, peço licença a você leitor para registrar o que um sujeito que tem uma Ataxia Cerebelar Progressiva – Ataxia de Friedreich, meu diagnóstico – sentiu ao assistir A Valsa de Lili. Em primeiro lugar, fiquei muito feliz ao perceber que é possível abordar esse tema sem resquícios de assistencialismo, o que poderia enfraquecer a trama (“Detesto quando olham pra mim com pena. Dá vontade de perguntar: escuta aqui, você já se olhou no espelho? Já sacou o que é que você faz com toda a sua liberdade?”), com abundância poética e uma denúncia contundente aos meandros, plenos de politicagem, do sistema de saúde (“matava o prefeito da cidadezinha onde eu morava… ele perguntou o nome da minha família. Como não conhecia, não fez nada, dizendo que não era obrigação dele”), além da compreensão de que dançar é uma questão de você se atirar sem medo nos braços da imaginação. Como diz Lili, tem gente com muito mais possibilidades e nem por isso dança com a vida.
Compreendi que a vida é isso: uma questão de posicionamento, de escolhas. Você pode aceitar os inúmeros nãos que os caminhos apresentam, mas você tem a opção de buscar os sims. Viver é um ato político, é uma questão de posicionamento.
SERVIÇO
A Valsa de Lili, de Aimar Labaki, direção de Débora Dubois, com Débora Duboc
Sesc Ipiranga – Auditório – Rua Bom Pastor, 822, Ipiranga
Temporada: Até a 1º de Setembro
Às quintas e sextas às 21h30, aos sábados 19h30 e aos domingos, às 18h30.
Ingressos: R$ 20,00 (inteira); R$ 10,00 (meia: estudante, servidor de escola pública, + 60 anos, aposentados e pessoas com deficiência); R$ 6,00 (credencial Sesc)
Duração: 60 minutos
Capacidade: 30 lugares
Sesc Ipiranga
Rua Bom Pastor, 822 – Ipiranga, São Paulo |Tel: (11) 3340-2000