Michel Fernandes, do Aplauso Brasil (Michel@aplausobrasil.com)
SÃO PAULO – Começo esta crítica com um pedido de desculpas a você leitor: por razões que foram maiores, demorei para escrever esse texto e, agora, você terá apenas até o próximo domingo (28), no Instituto Cultural Capobianco, para assistir Gotas D’ Água Sobre Pedras Escaldantes, texto de Fassbinder (As Lágrimas Amargas de Petra Von Kant) escrito em sua juventude – ele tinha apenas 19 anos – que revela as deformidades do caráter dos seres que sabem ser detentores do poder e, em seu egocentrismo exacerbado, são cruéis com os que estão a sua mercê.
Rafael Gomes assina uma direção bastante singela, guiada pelo texto de Rainer Werner Fassbinder e ocupada em sublinhar o jogo cruel a que estão submetidos esses personagens. Na primeira cena em que assuntos, aparentemente, triviais são falados – mas que são pistas que dão outras camadas de entendimento à medida que a trama avança -, como suas profissões, as relações que tem com o amor e o valor que conferem ao dinheiro, Franz (Felipe Aidar) e Leopold (Luciano Chirolli), envoltos numa alta energia sexual, finalmente, entram no terreno da sedução, liderado por Leopold, mais experiente e seguro, culminando na cama.
Na sequência, já passado algum tempo que os dois, Franz e Leopold, estão morando juntos, na casa de Leopold, começa a ficar mais evidente a crueldade de Leopold: ele é o “provedor”, o que se ocupa em trabalhar e pagar as contas, além de ser o dono da casa em que moram, o que é mote para a fragilidade de Franz ficar mais à flor da pele.
Claro que essas conjecturas sobre os caracteres emanados pelos personagens são possíveis pelas interpretações. Luciano Chirolli dá a Leopold uma frialdade cruel, na cena final parece que ele até pensará em Franz, mas sua preocupação consigo mesmo e com o prazer próprio falam mais alto. Já Felipe Aidar desenha Franz com uma fragilidade crescente e silenciosa.
Na cena final da peça, Anna (Nana Yazbek), ex-namorada de Franz, chega a casa deste e, vendo-o infeliz, tenta convencê-lo a reatarem, mas Leopold volta mais cedo que o previsto e traz consigo Vera (Gilda Nomacce em pungente criação), a mulher com quem Leopold viveu por sete anos, e que revela a Franz a que ponto o homem amado por ambos pode chegar para satisfazer seus desejos que, depois de passada a novidade do mesmo, é cruelmente descartado.
É engraçado que Fassbinder não tenha dado a devida importância à obra, mas o cineasta francês François Ozon e, agora, o Instituto Cultural Capobianco, nos dão a oportunidade de contato com Gotas D’ Água em Pedras Escaldantes que hoje, quando as relações com o outro são liquidas e frágeis os laços afetivos, se fazem urgentes.
Vale à pena assistir!
FICHA TÉCNICA:
Texto: Rainer Werner Fassbinder. Direção: Rafael Gomes. Assistência de Direção: Thiago Ledier. Atores: Luciano Chirolli, Gilda Nomacce, Nana Yazbek e Felipe Aidar.Produção: Euforia Produções, Substância Filmes e Outras Misturas e Complementar Produções. Produção geral: Isabel Sachs. Direção de Produção: César Ramos.Produtor Executivo: William Costa. Produção de elenco: (Franz e Anna): Alice Wolfenson. Preparação corporal: Fabrício Licursi. Projeto Gráfico e Fotografia: Laura Del Rey. Figurino: João Pimenta. Cenário: André Cortez. Assistente de Cenografia:Fernanda Ocanto. Cenotécnico: Maurilio Dias. Iluminação: Wagner Antonio. Operação de Som: Renan Almeida. Operação de Luz: Robson Lima. Assessoria de Imprensa: Arte Plural. Patrocínio: Construcap. Realização: Instituto Capobianco e Ministério da Cultura.
SERVIÇO:
GOTAS D’ÁGUA SOBRE PEDRAS ESCALDANTES. ATÉ DOMINGO (28). Instituto Cultural Capobianco. Endereço: Rua Álvares de Carvalho, 97, Centro (SP). Telefone: 3255-8065 / 3237-1187 Temporada: Sextas-feiras, às 21h30, sábados, às 21 horas e domingos, às 20 horas. Ingressos: R$30 e R$15. Capacidade: 35 lugares. Classificação: 14 anos. Duração: 90 minutos. Gênero: Drama.