Kyra Piscitelli, do Aplauso Brasil (kyra@aplausobrasil.com.br)
SÃO PAULO – Race (Corrida, Raça) é um espetáculo necessário. Traz um jogo cênico raro, um texto cheio de nuances e boa direção. Demorou um ano e meio para desembarcar em São Paulo. Já fez temporadas no Rio de Janeiro e uma em Minas Gerais e merecia rodar o Brasil. O tema olhado de forma mais abrangente é racismo. As feridas ficam ali expostas em meio aos bastidores da construção da defesa de um homem branco acusado de estuprar uma jovem, negra.
O segundo espetáculo da Trilogia Mamet tem o mesmo mérito do primeiro – Oleanna, também encenado pela CiaTeatro EPIGENIA. Não traz respostas. Não há julgamentos e nem acusações. Os personagens servem ao jogo de verdade e mentira e o público vira júri e detetive. Os processos históricos, os opressores e oprimidos e o que mais levar em conta para montar esse quebra-cabeça? O que há de verdade, de hipocrisia e preconceito em nossa sociedade?
A plateia do Viga Espaço Cênico some para Race. As cadeiras são colocadas em duas fileiras (uma em frente da outra) e o palco fica entre elas. O público se vê e se analisa a cada momento. Além da proximidade entre as cenas e a plateia, a sala está lotada de luz. O diretor Gustavo Paso cria um aprisionamento e um calor real em cena. Com tal sensação, o espectador, inevitavelmente, não só se sente parte da cena como realmente o é.
O jogo de domínio e dominado em Race nos põe para refletir sobre os julgamentos, a nossa história, a situação da mulher, a situação da mulher que é negra e de oprimidos e opressores. E o melhor: sem moralismos, sem palavras pela metade. Race é visceral em nos fazer pensar. E dá ao negro o protagonismo da cena. Isso é raro ainda que, no Brasil, sejam a maioria. E o texto nem brasileiro é….
Em Race, as feridas ficam abertas e os atores dão um baile de movimentação e de conectividade um com o outro. Gustavo Falcão, Heloísa Jorge, Leandro Vieira e Clóvis Gonçalves estão entregues e conscientes do texto que têm em mãos.
Race ainda brinda o público com a rara chance de debater o que viram em cena. Por dez minutos, os atores continuam com a plateia para conversar. Teatro, reflexão e sociedade. Imprescindível.
Ficha Técnica :
Direção: Gustavo Paso
Tradução: Leo Falcão
Figurino: Luciana Falcon
Iluminação: Paulo Cesar Medeiros
Cenário: Luciana Falcon e Gustavo Paso
Trilha: Andre Poyart
Diretora de Produção: Luciana Fávero
Assessoria de Imprensa: Duetto Comunicação
Realização: Paso D’Arte Eventos e Cia Teatro Epigenia
Mais informações em: http://viga.art.br/