Afonso Gentil, para o Aplauso Brasil (redacao@aplausobrasil.com)

SÃO PAULO – Os mais antigos sabem o quanto as montagens dos teatros da Bela Vista e arredores contribuíram para impor respeito pela excelência artística obtida sistematicamente. Tudo começou com a abertura do TBC (Teatro Brasileiro de Comédia, 1948), fruto da coragem e audácia do industrial italiano Franco Zampari, também ele responsável pelos filmes de sucesso internacional dos míticos estúdios da Vera Cruz. Uma perguntinha marota, talvez: será que alguma estatua venerando a memória de Zampari dignifica algum salão nobre de palácios estatais?
O TBC viu nascer o Maria Della Costa, o Bela Vista (hoje, Sérgio Cardoso), depois o Arena, que com seus memoráveis sucessos musicais não deixaria nenhum crítico relacionar qualidade artística com o tamanho da plateia.
A eles viriam se juntar o Ruth Escobar e outros e mais outros, transformando o bairro da Bela Vista num efervescente caldeirão cultural. A abertura de novos teatros espalhou-se pelos quatro cantos da cidade. Mas o “nicho” da Bela Vista continua com seu charme senhorial reforçado pelas montagens malditas benditas dos inquietos da Praça Roosevelt, da chancela musical do Renault (ex-Abril), do Aliança Francesa ( tio do TAPA), do Anchieta e, por que não? do Itália?

Agora graças ao desprendimento – melhor seria dizer atrevimento – do Núcleo Experimental de Teatro com o multiartista Zé Henrique de Paula (produtor, diretor, cenógrafo, figurinista e até letrista) à frente de gente muito talentosa, esta montagem do musical norte-americano com ares brechtianos, Urinal, faz a Barra Funda emergir de sua condição operária e ser arremetida ao burburinho cultural (e também de entretenimento, vá lá!) incessante da Bela Vista.
É FÁCIL FALAR BEM DE URINAL
A direção esperta (mais uma vez digna de figurar em listas de melhores do ano), o cenário “vitoriano” bem executado (valorizado ainda mais pela iluminação de Fran Barros) e os figurinos que remetem ao Brecht das óperas sombrias, todos da lavra de Zé Henrique de Paula; o texto de 2001, que começou sua carreira off Broadway, da dupla Greg Kotis e Mark Hollmann, curiosamente bom, agradável de se acompanhar apesar do desconforto dos temas da corrupção e da crise hídrica, muito irônico, senão sarcástico na crítica social e política. Logo a seguir, a adaptação das musicas e letras com direção musical de nada menos que Fernanda Maia e sua vibrante banda instrumental, todos em vitoriosa batalha com a mesmice à espreita nos musicais. A presença de Inês Aranha na preparação dos atores dividindo a vertiginosa coreografia com Gabriel Malo, mantendo a alta temperatura do espetáculo.
O elenco é outro trunfo da dupla Zé Henrique e Fernanda Maia que, sem as costumeiras audições, conseguiu vigoroso desempenho coletivo; nomes de respeito no meio artístico, de currículo diverso, cantam com tal entusiasmo e prazer que dá ao gênero um bem-vindo frescor São eles: Bia Bologna, Bruna Guerrin (Sol, a mocinha protagonista), Caio Salay (o anti-herói Bonitão), Daniel Costa (um mestre de cerimônias que remete à Cabaret), Fábio Redkowicz (fazendo dupla impagável com Daniel), Gerson Steves (um senador que Deus nos livre!), Luciana Ramanzini (a garotinha que tudo vê e tudo comenta, cuidado com ela!), Nábia Vilella e seu vozeirão invejável, Paulo Marcos de Brito, Roney Facchini (com a autoridade do papel), Thiago Carreira e Thiago Ledler, com momentos bem resolvidos.
Vindo de quem vem, do exemplar Núcleo Experimental de Teatro, para nós a excelência do espetáculo não só empolga como chega a surpreender. E para o público vem a ser uma bela e alvissareira novidade.
Serviço: Urinal, o Musical/ Teatro do Núcleo Experimental / Rua Barra Funda, 637 – Barra Funda /tel.3259-0898/6ª., sábado e Segunda às 21 h. Domingo 19h / R$ 40,00 (6ª.grátis). 125 minutos com intervalo/ estacionamento não conveniado em frente ao teatro/ até 06/07.