Michel Fernandes, do Aplauso Brasil (michel@aplausobrasil.com)

A excelência do teatro musical realizado no país, a cada nova estreia, sobretudo as assinadas por Charles Möeller e Cláudio Botelho (segundo biografia de Tânia Carvalho, Os Reis do Musical), avança incontáveis degraus de aperfeiçoamento reconhecido até pelos menos simpáticos ao gênero. Em O Despertar da Primavera – O Musical, criação de Steven Sater e Duncan Sheik com base na peça homônima do final do século 19, do alemão Frank Wedekind, o que se vê em cena é uma requintada de discussões, propostas por Wedekind, dos tabus que cercam o rito de passagem.
A canção que abre o musical, Mama who bore me (Mamãe me explica), traz num dos significados da palavra bore, (atravessar) a chave do que o espetáculo, atualmente cumprindo curta temporada em São Paulo – a segunda, atendendo pedidos – no Teatro do Shopping Frei Caneca, mesmo que se pense que alguns tabus que ele apresenta já estejam superados nesse século 21, ainda sejam totalmente presentes numa pseudo-evolução de nossa sociedade que continua a protelar discussões mais aprofundadas, ficando apenas à beira dos tabus e fingindo os romper seriamente, do que guiar os mais jovens nessa travessia de sua primavera, o ritual de passagem entre a infância e a adolescência, período em que tantos são os instintos despertados. E a incapacidade da mãe de Wendla, protagonista da trama, em falar franca e profundamente sobre sexo repercute no final da trajetória da personagem.
Frank Wedekind, autor do original (final do século 19) não teve o prazer de assistir sua primeira montagem, pois, publicado em 1891 imediatamente o texto teve seus direitos de encenação cassados pelas autoridades alemãs.
Não é de se admirar que numa sociedade que prefere varrer assuntos indigestos para baixo do tapete hipócrita do moralismo exacerbado, uma peça que desvela tantos tabus como O Despertar da Primavera, incomodasse. Assuntos como o despertar da sexualidade, aborto, suicídio, falta de diálogo entre pais e filhos, incesto, pedofilia, abuso sexual, entre outros, estão em carne viva para um sistema que não deseja sequer se aproximar da ferida.
Embora pensemos que alguns tabus estejam superados, infelizmente, em pleno século 21, o diálogo entre pais e filhos, mesmo que a pauta das conversas entre ambos tenha se alargado, continua deficitário na resposta ao apelo do adolescente para guia-lo nesse período de travessia.
O Musical
Há um fato peculiar no formato musical de O Despertar da Primavera – O Musical: as canções são reflexos do imaginário dos personagens. Diferente da proposta de outros musicais, os números musicais, aqui, não substituem as cenas em seu aspecto de mola de avanço à trama. Um dos grandes acertos dos adaptadores norte-americanos foi não fazer vistas grossas ao potencial dramático do texto e deixa-lo presente, cabendo à parte musical ser um plus e não substituto.
Não-réplica
Há quase uma década, instalou-se uma empresa multinacional de entretenimento que instaurou no país um novo costume: a reprodução de musicais consagrados na Broadway (Nova Iorque) e West End (Londres), a Cie Brasil, agora Time4Fun. Concordemos ou não com o ideário da empresa, é mote para um debate sem fim. A questão mais objetiva e meritosa da empresa é proporcionar aprimoramento técnico para a realização de musicais: seja na preocupação dos atores na preparação vocal e corporal, seja no contato com técnicas facilitadoras na logística de superproduções.
Até o público mudou: ficamos mais exigentes com as produções auto-intituladas superprodução, sobretudo aos musicais que não são meras reproduções, caso de O
O Despertar da Primavera – O Musical.
Sejam os musicais produzidos por Jorge Takla – como My Fair Lady e O Rei e Eu –, ou os da dupla Charles Möeller & Cláudio Botelho – como Avenida Q e A Noviça Rebelde – já comprovaram a indubitável capacidade de realizarem montagens tão, para não dizer mais, exuberantes quanto aquelas que são as matrizes. Com a vantagem de somar, a partir de suas leituras, a criatividade de que são dotados.
A vantagem da não-réplica está na liberdade de aplicar algo mais autoral ao espetáculo, fugindo do gesso que tende a ser a reprodução de um modelo.
E, assim sendo, a versão brasileira de O Despertar… traz modificações do original que tornam o espetáculo mais contundente e emocional.
O formato original trata os números musicais como se estivessem à parte do espetáculo. A ação da peça é momentaneamente interrompida para que, com microfone de mão, os atores cantem a devida canção, tal qual se fossem cantores num show de pop rock. Talvez, num universo em que a fórmula que rege os musicais norte-americanos, esse desvio programado do que é padrão seja deveras interessante, mas, Möeller e Botelho souberam dosar entre a demasiada radicalidade, incorporando as canções à ação, do original musical e a força do original de Frank Wedekind, dando um sabor próprio à juventude atual sem perder o tempero do original do século 19, por si só à frente de seu tempo.
Some-se à nova roupagem dada pela dupla carioca à bem cuidada produção com elegantes e belíssimos figurinos de Marcelo Pies, a funcional e, igualmente bela, cenografia de Rogério Falcão, a premiada e expressionista iluminação de Paulo César Medeiros.
Cláudio Botelho extrai da música de O Despertar… uma interessante e requintada mescla entre o pop-rock e o erudito com instrumentos como o violino, seguindo, à risca, a música original e dando à versão brasileira letras de extrema poesia e próximas à nossa realidade.
Do elenco, os destaques principais são o ator Pierre Baitteli que, na pele de Melchior, alcança verdade, intensidade e carisma raro. Débora Olivieri e Eduardo Semerjian, nos papéis dos personagens mais maduros, alcançam desempenho satisfatório..
Charles Möeller e Alonso Barros, respectivamente na direção geral e coreografias completam a exuberante equipe criativa do espetáculo.
O DESPERTAR DA PRIMAVERA – O MUSICAL
Música de Ducan Sheik
Texto e Letras de Steven Sater
Baseado na obra de Frank Wedekind
DIREÇÃO: Charles Möeller
VERSÃO BRASILEIRA / SUPERVISÃO MUSICAL: Claudio Botelho
DIREÇÃO MUSICAL: Marcelo Castro
COREOGRAFIA: Alonso Barros
CENÁRIO: Rogério Falcão
FIGURINOS: Marcelo Pies
VISAGISMO: Beto Carramanhos
DESIGN DE LUZ: Paulo César Medeiros
DESIGN DE SOM: Marcelo Claret
COORDENAÇÃO ARTÍSTICA: Tina Salles
ELENCO
Malu Rodrigues
Letícia Colin
Pierre Baitelli
Bruno Sigrist
Thiago Amaral
Débora Olivieri
Eduardo Semerjian
Com:
André Loddi
Clara Verdier
Danilo Timm
Eline Porto
Estrela Blanco
Felipe de Carolis
Felipe Tavolaro
Gabriel Falcão
Laura Lobo
Lua Blanco
Mariah Viamonte
Thiago Marinho
PRODUÇÃO EXECUTIVA: Aniela Jordan e Luiz Calainho
PRODUTOR ASSOCIADO: Sergio Ajzenberg
UM ESPETÁCULO DE Charles Möeller & Claudio Botelho
TEATRO SHOPPING FREI CANECA
Rua Frei Caneca, 569 – 6º andar – Consolação
Informações: (11)3472.2226/ 2229/2230
Estação do Metrô: Consolação
Estreia dia 10 de Julho
Temporada:
De 10 a 19 de julho (10, 11, 12 / 17, 18, 19): Sábado 18h, domingo 20h, segunda 20h30
De 23 de julho a 15 de agosto (23, 24, 25 / 30, 31, 1 / 6, 7, 8 / 13, 14, 15): Sexta 21h, sábado 21h, domingo 18h
Sábado: 18h00
Domingo: 20h00
Segunda-feira: 20h30
Ingressos:
Sábados e domingos R$ 70,00 (inteira) e R$ 35,00 (meia)
e Segundas R$ 50,00 (inteira) e R$ 25,00 (meia);
Classificação etária: 14 anos
Lotação: 600 lugares
Horário da Bilheteria:
Terça a domingo, das 13 às 19h ou até o inicio do espetáculo, quando houver.
Vendas pela internet: www.ingressorapido.com.br
Vendas pelo telefone: 4003-1212
Cartões: Todos (menos Hipercard)
As compras de ingressos também poderão ser feitas através do site
www.ingressorapido.com.br ou pelo telefone (11) 4003.1212 com taxa de
conveniência sobre o valor de face de cada ingresso.